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‘Piquenique’, uma aventura com sabor de esperança

O Teatro Independente e o Pequeno Teatro usam o pretexto do universo gastronômico mediado pela prática do piquenique para reapresentar às crianças tanto essa forma de se alimentar que preza pelo contato com a natureza, com a diversão e com a coletividade, quanto para introduzir sabores e prazeres que, muito provavelmente, alguns pequenos e pequenas de hoje pouco conhecem como manjericão, páprica, pimenta do reino, dentre outros.

Com o músico Raoni Costa, a atriz Carolina Pismel e o ator Zé Wendell em cena sob a direção de Flávio Souza, a aventura Piquenique, acontece num  gracioso cenário que relembra as cores das cantinas italianas em verde, vermelho e branco, ladeado e encimado por guarda-chuvas e guarda-sóis nas mesmas cores. A mesinha ao centro composta por caixotes na cor verde acomoda flores, xícaras, pratos, frascos de vidro, reforçando a paleta que dialoga com o cenário e com o figurino repleto de estampas e texturas florais, babados e rendas.

O conjunto cênico aponta para o interesse por criar uma atmosfera de encanto e fantasia com a qual é conduzida a aventura da cozinheira e heroína Greta, que tem por missão desvendar os motivos da escassez de recursos naturais de sua terra e, portanto também de alguns ingredientes, e assim, dar continuidade às suas receitas, o que fará com o auxílio das indicações de uma cozinheira meio fada, de nome Beladona (que descobrimos ser também o nome de uma erva curativa).

Nessa narrativa infantil estão apontados desafios do nosso tempo como a exploração desenfreada do meio ambiente e o avanço dos governos antidemocráticos. Engana-se quem acredita que crianças não tratam dessas questões a partir dos temas transversais que as instituições de educação se esforçam para abordar. Elas podem não usar o mesmo vocabulário que pessoas adultas, porém acreditamos que elas têm plenas condições de relacionar a história de fantasia Piquenique com o que ocorre no mundo real.

Meninas como a sueca Greta Thunberg ou a ugandense Vanessa Nakate têm liderado debates fundamentais sobre preservação do meio ambiente, extrativismo industrial, políticas públicas de responsabilização de países altamente industrializados cuja atividade impacta poluição de ecossistemas etc. A Greta de Piquenique, que alcança o topo da montanha, certamente homenageia essa geração de garotas ativistas e empoderadas. 

A heroína encontra o castelo do tirano e empresário bélico que lhe adverte sobre as portas e as chaves que existem neste local. Evocando o conto francês do Barba Azul, a  curiosa protagonista descobre o que existe atrás de cada uma das portas, inclusive daquela que não possuía chave e com sua atitude destemida desvenda o mistério e salva sua terra.

Piquenique tem ar de revisita: se inspira num clássico da literatura infantil que trata de uma jovem corajosa; emprega recursos tecnológicos antigos como o retroprojetor para ilustrar passagens da aventura, citando o teatro de sombras; anima as crianças com canções atemporais como Alecrim Dourado, que nas terapias holísticas, dentre outras propriedades que regozijam o paladar, trazem energia, alegria e bem-estar. É um espetáculo leve que conscientiza e inebria sua plateia com jeito de tarde ensolarada rica em ludicidade e visualidade, que são alimentos saborosos para nossas esperanças de legarmos um meio ambiente mais saudável às gerações futuras.

(Foto da capa: Victor Natureza)

Olhar crítico de

RENATA FELINTO

obra

PIQUENIQUE

Teatro Independente e Pequeno Teatro

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